sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

2016

Se não acontecer nenhuma tragédia nas nossas vidas, os anos , feitos de dias e noites  sonhos e insônias, são a mistura de tantos momentos e quando olhamos para trás, às vezes nossa vida parece um romance bastante fragmentado.
O Brasil atravessa dias duros, recessão, desemprego, professores e servidores sem receber seus salários.Mas esperamos que a economia melhore, que tudo melhore.
Neste ano, em agosto, meu marido Juan Arias ficou oscilando entre o nosso mundo e o outro, passei 18 dias morando no hospital e joguei xadrez com a morte. Ganhamos. Minha família e alguns amigos maravilhosos foram o meu pão, meu alimento. Agradeço ao Cristiano Mota Mendes, meu maisqueamigoirmão, Monica Botkay, Bia Hetzel, Silvia Negreiros, William Amorim.  Neste ano, apesar da maioria dos meus amigos pensar politicamente de uma maneira diversa da minha, não perdi nenhum amigo, não bloqueei ninguém por ter posições e pensamentos diferentes dos meus. Basta ver como os políticos que ontem eram inimigos, hoje se defendem entre si e se abraçam. Não vale a pena perder amigos por política. Políticos passam.
Neste ano não consegui publicar nenhum livro, foi um ano muito duro para as editoras, para a cultura de um modo geral. Mas encontrei um atalho, um caminho como aqueles que existem dentro da mata, meio escondidos e que vão dar numa clareira. Os meus e books Livros e Leitores e Delírios, pouco a pouco vão conseguindo leitores e para 2017 tenho algumas publicações em papel. E uma coletânea nova de poemas para virar ebook ano que vem no segundo semestre.
Neste ano conheci pessoas maravilhosas e amizades se fortaleceram, Meu projeto Café, Pão e Texto deu um grande sentido para a minha vida.Neste ano fiz viagens incríveis para apresentar meus livros e falar de leitura.
Então talvez o segredo deste romance de milhares de páginas que é a nossa vida, seja mergulhar profundamente nos sentimentos, viver a vida como a mais perigosa e emocionante das aventuras e tudo de bom ou de ruim pode acontecer.
Espero que em 2017 aconteçam só coisas boas para todos nós.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

ENGOLINDO CÉU

Hoje foi dia de ganhar lindos presentes. De Delmino Gritti, um apaixonado por poesia com vários livros sobre o tema publicados, recebo um arquivo belíssimo. Copiei algumas frases do Manoel de Barros falando de poesia. É de gritar!
O poeta lê o mundo de um ponto de vista insólito ou encantado. Ele transvê o mundo”. (Manoel de Barros)

Os andarilhos, as crianças e os passarinhos têm o dom de ser poesia. Dom de ser poesia é muito bom. (M. de Barros)

Uma árvore bem gorjeada, com poucos segundos, passa a fazer parte dos pássaros que a gorjeiam. (Manoel de Barros)

O sentido normal das palavras não faz bem ao poema. Há que se dar um gosto incasto aos termos.  (M. de Barros)

Minhocas arejam a terra; poetas, a linguagem e a vida. (Manoel de Barros)

Os grilos de olhos sujos se criam nos armazéns. (Manoel de Barros)

Poeta é um ente que lambe as palavras e depois se alucina. (Manoel de Barros)

A quinze metros do arco-íris o sol é cheiroso. (Manoel de Barros)

Há nas árvores avulsas uma assimilação maior de horizontes. (Manoel de Barros)

Escurecer ascende os vagalumes. (Manoel de Barros)

Tudo aquilo que nos leva a coisa nenhuma e que você não pode vender no mercado como, por exemplo, o coração verde dos pássaros serve para a poesia. Tudo aquilo que a nossa Civilização rejeita, pisa e mija em cima serve para a poesia.  (M. de Barros)

Aquele que não morou nunca em seus próprios abismos nem andou em promiscuidade com seus fantasmas não foi marcado. Não será marcado. Nunca será exposto às fraquezas, ao desalento, ao amor, ao poema. (M. de Barros)

As coisas que não levam a nada têm grande importância para a poesia. Pessoas desimportantes dão para a poesia. O que é bom para o lixo é bom para a poesia.
                                                                                                                                                                                                                     (M. de Barros)

 Poesia é a loucura das palavras. O poeta é mais a palavra com febre, decaida, fodida em sarjeta. O poema é antes de tudo um inutensílio. (M. de Barros)

O sabiá, uma pequena coisa infinita do chão. Nas fendas do insignificante ele procura grãos de sol. Seu canto é o próprio sol tocado na flauta. (M. de Barros)

Poeta, individuo que enxerga semente germinar e engole céu. Espécie de vazadouro para contradições. Sabiá com trevas. Sujeito inviável, aberto a desentendimentos como um rosto. (M. de Barros)

Trapo- andarilho-mendigo: pessoa que tendo passado muito trabalho e fome, deambula com olhar de água-suja no meio das ruínas. Quem as aves preferem para fazer seus ninhos. Diz-se também de quando um ser humano caminha para o nada. (M. de Barros)

E me chegou pelo correio dois livros de uma escritora que na minha santa ignorância eu nunca havia lido, Cristiane Lisbôa. O primeiro que estou já terminando se chama Duas Pessoas são Muitas Coisas e o segundo Papel Manteiga,. A editora é Memória Visual. 
O mais incrível é que veio junto um cartão lindíssimo de uma pessoa chamada Vera. Mas não me lembro quem é. Veio assinado sem sobrenome. Vera, se você estiver me lendo, me avise, pois estou encantada com o primeiro livro. É lindo, leve,sua escrita tão interessante e poética. Estou amando! As receitas que estão trançadas com a narrativa são maravilhosas. E quero agradecer.
Levo os dois para a montanha (parto amanhã em dois ônibus e um carro, embora preferisse ir de Pégaso) e mais o livro da Elvira Vigna, Em Palimpsesto de Putas, que também me chegou pelo correio com dedicatória (ganhou o A.P.C.A) e que também já comecei e que é um livro duro, desses que machucam, assim são os romances da Elvira. .Elvira dói. Deixa a gente em carne viva.
Como podem ver, estes presentes já estão no coração. E começa bem o Natal.
Segundo a definição para poeta do Manoel de Barros, eis o que sou: indivíduo que enxerga semente germinar e engole céu. Vou para a montanha engolir céu e virar árvore, como sempre.

domingo, 18 de dezembro de 2016

E TUDO VOA

E tudo voa ao meu redor. Borges disse numa entrevista e escrevi dentro de mim: Para o escritor a vida é a sua matéria prima, então nada pode ser descartado. Nem alegrias nem tristezas, nem momentos sublimes, nem momentos da mais profunda dor.
E eu voo junto, já que a Terra não está parada. Tudo sempre em movimento.
Apanho em pleno voo uma palavra, uma imagem, uma sensação, uma lembrança, um sentimento e faço o poema. Que às vezes se comporta como um gato:  vem quando não chamo e quando chamo não vem.
Em algumas épocas duras da minha vida escrevi muito e isso me ajudou. Em outras a poesia me desabitava e tudo ficava muito pior.
O poema é um jeito de respirar? É o meu diafragma, existe dentro de mim mesmo quando não é escrito?
Li e me apaixonei quando tinha 23 anos pelo poeta Jules Supervieille, porque ele retira todas as coisas do chão. Mesmo a sua rua em Paris, Boulevard Lanne, vai parar no céu. E pelos quadros do Chagall pelo mesmo motivo. Então entendi que a minha poesia sempre quer fugir pro céu, sempre quer voar.
Às vezes levo meu leitor junto, e como na música do Coltrane, A Love Supreme, essa é a felicidade suprema, quando alguém voa junto comigo.

sábado, 17 de dezembro de 2016

EÇA DE QUEIRÓS

Quando decidi que leríamos Eça , A Relíquia e As Cidades e as Serras, Rafael, do nosso grupo me disse que sua amiga Monica Figueiredo, professora de literatura portuguesa da UFRJ, certamente gostaria de vir. Ela é especialista em Eça. Como ela mesma nos disse hoje, Eça é o seu homem.
Devo confessar que estava nervosa e com medo. Nossas discussões são afetivas e não seguimos nenhuma linha.
Rafael me acalmou ontem. Ele me disse, a Monica é maravilhosa você vai ver.
Como é dezembro faltou muita gente, mas mesmo assim a sala estava cheia. E Monica começou esbanjando tudo, charme, simpatia, ironia. Monica fala com paixão e com o corpo todo, além de ser íntima de cada suspiro do "seu homem", de quem ela não esconde os "defeitos". Começou nos dizendo que o século XIX ainda não acabou e nos colocou politicamente nesta época de tantas mudanças. Falou do declínio de Portugal, das vertentes literárias e começou nos contando, como ela mesmo disse, histórias de "cozinha", os bastidores, as fofocas. Falou do estranho nascimento de Eça, que só foi reconhecido aos 40 anos pela mãe, ou seja, era reconhecido pelo pai mas não pela mãe! Falou da sua vida desastrada, das suas idas e vindas, de como fez sozinho um jornal inteiro e como O Crime do Padre Amaro fez sucesso imediato. Como era um escritor que reescrevia mil vezes o seu texto, extremamente zeloso e consciente do seu talento. Falou da crítica negativa de Machado de Assis, e oh que delícia, falou que certamente essa crítica foi movida por uma certa inveja de Eça que lhe atrapalhava as vendas com seu sucesso e que esse fato, a crítica negativa, ajudou ainda mais o sucesso do livro. Ao nos colocar no século XIX, Monica chamou a atenção para o leitor do século XIX, um leitor burguês, lendo um romance burguês: exatamente como nós.
A Relíquia, todos sabem, é um romance que tira qualquer leitor da depressão. Se alguém estiver triste, abra A Relíquia em qualquer página e a tristeza se dissipará imediatamente. O livro é  debochado e demolidor. Eça ridiculariza tudo e escreve tão magnificamente que sentimos os cheiros, ouvimos as vozes, andamos pela antiguidade na viagem mais inesquecível, na cena do sonho. Voltamos com a certeza absoluta de que estivemos lá, naquele dia, há dois mil anos atrás.
A trama mirabolante da troca dos embrulhos tendo como consequëncia a perda da herança, também é perfeita. E o que dizer do ridículo que são as relíquias? Falamos da maravilha que são as personagens femininas do romance, as prostitutas incríveis do Eça. Falamos da perfeição que é a personagem da titi.
Enfim, aplaudimos de pé.
Monica nos disse que As Cidades e as Serras era um romance mais problemático por ser póstumo e mexido por Ramalho Ortigão na parte das serras.
Talvez Eça não tivesse sido tão romântico e bonzinho no final. Eça não era bonzinho. Mas é também um romance maravilhoso. Como Eça foi profético! Ele já anuncia a nossa terrível sociedade de consumo, a nossa frivolidade de possuir coisas inutilmente. E as cenas do livro são tão cinematográficas. Os passeios por Paris, aquela nobreza decadente, o vazio, o spleen do fin de siècle, está tudo ali. Destaque para a cena do peixe entalado no elevador.
E Monica ressalta um ponto muito importante, a salvação do Jacinto vem pelo trabalho. É o trabalho que lhe dá outra existência. Fala também da crítica social, da descoberta por Jacinto da miséria e de seu desejo então de consertar o mundo.
Falamos das comidas maravilhosas no romance, nos dois romances.
Fechamos o encontro com a leitura de poemas de Fernando Pessoa.
Trocamos livros como presentes de Natal.
E fomos para a mesa, Eça nos deu fome: escondidinho de aipim com carne seca, empadão de legumes, abóbora , arroz, salada. Fernando ofertou brownies artesanais e os proseccos , Ângela trouxe lindos presentes,
Hoje tivemos a volta do Paulo e o ingresso de Renée, minha prima e seu marido. Minha tia Alice, a última da sua linhagem, imã da minha mãe, veio e adorou.
Eu e Felipe fomos os aniversariantes presentes, já que Cristiano e Ana não vieram.
Monica, nossa convidada, ficou muito impressionada com a duração do Clube, já são mais de 6 anos e já somos uma família. Vida longa para nosso Clube, que é uma das maiores alegrias da minha vida.
Que pessoas se juntem para falar de livros e festejar a vida, é um acontecimento.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

FIM DE TARDE FIM DE ANO

É estranha e interessante essa energia de fim de ano. Penso nisso aqui sentada no fim da tarde.
Este foi um ano duro: recessão, desilusão com os rumos políticos, de ambos os lados. Descobrimos um Brasil abjeto, sabíamos da sua existência, mas agora todos os holofotes se acenderam e não podemos mais fingir que a lama não está aí. De certa maneira estamos todos contaminados.Os políticos nos contaminam com suas ações vergonhosas.
Mas mesmo assim, a energia desse fim de ano, de todos os finais de ano, é algo diferente. Há uma pressa, uma espécie de frenesi, há um vaivém, há uma urgência , como se fôssemos perder o trem, a carruagem, o navio, um grande encontro.
Penso nos meus amigos. Quase todos dispersos por este mundão de Deus. Queria nomeá-los todos. Os antiquíssimos, os novos, os que estão sempre em meu coração, em meus pensamentos. E agradecer. Porque o que nos sustenta a cada minuto é o dom da amizade. Saber que mesmo longe eu habito outras pessoas que por alguma razão possuem um laço comigo, isso me ajuda a viver .Porque viver, todos sabem, é muito perigoso. Gostaria de juntá-los todos, como num sonho, numa grande festa. E então seria a festa de fim de ano mais bela do mundo.
 

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

NATAL

Mas de verdade o que é o Natal? O espírito natalino não seria um entrelaçamento-entendimento entre todos?
Há uma atmosfera tão carregada neste dezembro. Todos gritam. Não haverá trégua.
Vi um filme muito lindo, não me lembro o nome e me chega agora pelos caminhos estranhos das lembranças, é um filme francês.
No interior da França um velho e sua filha pianista são obrigados a receber um oficial nazista.
O nazista ouve a moça tocar. Se emociona. Para no umbral da porta e fala com ela. Fala que ama a música. que é músico, que não queria estar na guerra. Ela não responde. Ela nunca responde.
Seu pai também nunca responde.
Mas dia por dia ele fala com a moça ao chegar a casa. Ao ouvi-la tocar. Ela não responde.
Ela nunca responde.
Ela é da Resistência. Numa manhã, há um carro que espera fora da casa. O hóspede e vários oficiais estão juntos para embarcar. No último minuto ela o chama e ele então não entra no carro. Que explode. Então eles fizeram isso um pelo outro. Ela salvou a sua vida. E ele agradeceu em silêncio e não a denunciou ou matou.
Para mim isso seria o espírito natalino.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

PROFESSORAS

Recebo professoras em minha casa, no Projeto Café, Pão e Texto. Neste ano fui homenageada por Itaboraí e lida em mais de 80 escolas. Recebi muitas e muitas professoras. Maravilhosas. Guerreiras. Incansáveis.
Agora me contam um pouco do seu desespero. Não recebem o salário desde outubro. E também em outros municípios essa triste história se repete.
Fica registrado o meu espanto. Se não pagarmos o aluguel recebemos uma ordem de despejo. Se pegarmos algo de graça no supermercado vamos presos. Se adoecermos mas não pudermos comprar o remédio necessário pioramos, etc, etc, etc. Então, como assim, é permitido não pagar o salário aos professores?
O professor e a professora são responsáveis por nossas escolhas, nossos rumos, quando, ainda crianças a vida é descoberta Ninguém é mais importante do que um professor. Talvez eu escreva porque Rosa Hermann acreditou em mim, minha professora da quarta série. Talvez tenha publicado meu primeiro livro porque Sandra, professora do meu filho amou os poemas.
Em que mundo estamos vivendo?

domingo, 11 de dezembro de 2016

VERÃO

Na minha infância morei no bairro Grajaú, na Rua Caruaru 40, na zona norte do Rio de Janeiro.
Era um sobrado amarelo. As casas onde vivemos nos primeiros anos de nossas vidas são indestrutíveis, embora não existam mais. Já disse Drummond.
O verão sempre me pegava desprevenida e me jogava num atordoamento.
Hoje o verão me traz a casa da minha infância. O ar está grosso, quase irrespirável aqui em Saquarema e nos dezembros da minha infância. E ela me aparece quase palpável. Feito miragem ou alucinação por causa do calor.
Naquela época a grande felicidade de dezembro eram as férias, que eram longas. E meu aniversário que sempre me traria algum presente.
Não tínhamos Natal, éramos judeus. Cresci sem espírito natalino.
Agora toda a minha existência é de outra matéria. É feita de livros. De palavras. É dezembro, faz um calor insuportável e vou buscar algum conto russo para sentir um pouco de frio.  

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

ELVIRA VIGNA

Acabo de saber que Elvira Vigna ganhou o Prêmio A.P.C.A por seu último romance "Como se estivéssemos em palimpsesto de putas".
Sinto uma alegria selvagem e telefono para Elvira, que me diz na sua simplicidade:
- Isso não tem a menor importância.
Nós nos conhecemos desde 1978, eu acho. É dela a primeira edição do meu livro Fardo de Carinho, que voltou a ilustrar tantos anos depois.
Somos pessoas reclusas, nós duas. Somos avessas a todo o burburinho social.
Eu sempre vivi bem retirada e Elvira também e hoje, no telefonema, falamos disso.
Das nossas esquisitices, das nossas bizarrices.
Faz pouco tempo um amigo me disse que eu pareço uma mulher francesa irritada, às vezes. Elvira nem se fala.
Vivo em duas casas, em dois lugares fora de grandes centros, sem nenhuma vida social. Saquarema parece um mosteiro ou um templo. Aqui sou regida pelo mar.
Na montanha vivo dentro do bosque. Sou regida pelas árvores. E nas duas casas, nos dois lugares, vivo para fazer poesia, mesmo quando não estou escrevendo. Isolamento maior impossível.
Quis falar disso e escrevi um texto muito bonito que se chama DUAS CASAS.
Elvira ilustrou e faz dois anos, por conta da crise, o livro espera a chance de sair, pela Lê Editora.
As ilustrações da Elvira são belíssimas, como sempre. E ela amou meu texto, como sempre.
Esta semana recebo a boa notícia de que o livro deve sair no primeiro semestre de 2017.
Elvira também ilustrou lindamente meu e book Livros e Leitores. E o livro já está com 977 visualizações.Logo chegará a 1000, e claro, vou abrir um vinho para festejar, pois estou apostando nesse novo caminho. Pescar leitores não é como pescar peixes. E eu jamais seria uma boa pescadora: sou ansiosa e impaciente. Com minha ansiedade e impaciência às vezes cometo erros fatais. Mas os leitores estão chegando e eu e Elvira estamos juntas nessa pescaria.
Natália Ginzburg diz no livro  As Pequenas Virtudes, que se o escritor não escrever a sua verdade o leitor descobrirá. Escrevo com tudo o que tenho, com tudo o que sou. E o meu leitor sabe disso.  

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

MAESTRO MOISÉS

Conheci o Maestro Moisés na E.M Castelo Branco aqui em Saquarema. Dei um nome para o Coral que o Maestro dirigia: Escola que Canta.
Depois o Maestro foi embora. Está em Búzios com um belo Coral de meninas.
O trabalho do Maestro vai além, muito além da música. Ele resgata a auto estima dessas jovens. Ele faz com que se sintam importantes, quando às vezes elas chegam de realidades muito complicadas.
A alegria do Maestro Moisés é dourada e sua alegria e seu amor pela vida é um convite.
Hoje conversávamos.
Ele me conta: No dia 21 fará uma caminhada musical com as suas meninas por Búzios desejando Feiz Natal e esperança para o próximo ano.
Ele me diz:"Vamos fazer a nossa parte! A vida não basta... por isso existimos! Poesia e Música.".
Claro, o mundo está horrível. Mas a gente não desiste. Vai trabalhando no pequeno, aranhas laboriosas, abelhas fabricando mel...
Tenho o sonho de que o Maestro possa voltar para Saquarema. Que trabalhe nas escolas. Que possamos juntar nossas vontades , misturar nosso pó de pirlimpimpim e fazer isso : Leitura e Música. Já vou fazendo minhas bruxarias e poções mágicas para que isso aconteça.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

DELÍRIOS

Há muito tempo publiquei o primeiro e book em meu site. Era uma coletânea de poemas para adultos, que fiz a partir de desenhos de Elvira Vigna. Chamei de Variações sobre Silêncio e Cordas. Ganhei uma resenha maravilhosa  no Prosa e Verso . Ganhei muitos leitores e alguns elogios de peso. Foi lido em escolas, em turmas do EJA e Ensino Médio. Fiz tudo sozinha, Elvira me deu os desenhos de presente e o acesso é grátis.
Depois fiz um e book para crianças com Caó Cruz Alves.
E o Livros e Leitores, novamente com desenhos da Elvira, onde conto a minha trajetória de leitora e poeta.
E agora entra no ar meu e book DELÍRIOS. São 33 poemas com uma linda apresentação do grande poeta José Salgado Maranhão.
Os desenhos são da minha irmã Evelyn Kligerman, ceramista e escultora. Ela fez placas de cerâmica, desenhou sobre as placas, quebrou as placas para conseguir os efeitos que queria, criou texturas e fez o designer gráfico. Meu cunhado Luis Mérigo, fotografou e fez a montagem e Gabriel Duarte criou o movimento. O efeito é belíssimo, maravilhoso.
Por que estou criando essa linha de e books com acesso livre para todos?
É simples. Quero leitores. O livro pode ser aberto no computador, tablet ou smarphone. No compútador ele tem movimento, e é muito mais bonito, mas no celular ou tablet, está em PDF.
Claro que também gostaria de ter o livro em papel, por uma boa editora. Mas entre ficar com meus poemas no cofre ou colocá-los ao alcance de qualquer leitor com um simples clique, optei por esse novo caminho.
É um caminho alternativo e preciso do meu leitor para ter êxito. Preciso de você.

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

A MALA CHEIA DE LIVROS

Estou novamente arrumando a mala para a montanha, Visconde de Mauá. Viajo amanhã bem cedo e gostaria imensamente que já tivessem inventado algum meio de transporte mais , digamos, interessante.
São dois ônibus e um carro. Muito melhor seria ir de vassoura voadora ou quem sabe, teletransporte. A gente pensava aqui e já estava lá.
Levo a mala cheia de livros. Os Delírios para o lançamento dia 29 e os que estou lendo.
Ontem terminei de ler o Um Mapa Todo Seu, da Ana Maria Machado, sobre Eufrásia Teixeira Leite e Joaquim Nabuco. Uma mulher bem impressionante para a sua época. Então, este não preciso levar. Já está dentro de mim. Ontem passei o dia inteiro no século XIX. Era muito difícil ser mulher e Ana faz uma reconstrução preciosa desse tempo.
Mas comecei a reler Memórias de Adriano da Marguerite Yourcenar e estou AMANDO reler este livro maravilhoso.
Levo o livro do Rafael Cardoso, Os Remanescentes, que me fará mergulhar pela milésima vez em minhas raízes, pois é a história do seu bisavô, a história do Holocausto, dos refugiados. O livro O Inferno Dos Outros , do David Grossman,  escritor israelense, fantástico, de quem lemos no Clube de Leitura Alguém Para Correr  Comigo e finalmente os dois livros do Eça de Queiróz que vou reler para o nosso encontro do Clube no dia 17 de dezembro: A Relíquia e As Cidades e As Serras. Amo os dois.
A mala vai pesada. E estou tão feliz com o meu lançamento que será uma grande festa junto com a família e os amigos.

 

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

AMIGOS

A Professora Jaline da Silva inventou um bingo para seus alunos com pedaços dos meus poemas . Mas há uma regra: todos os poemas falam de amigo.
Para mim a amizade é sagrada. É o vínculo mais forte que há. Uma paixão se apaga. Uma paixão faz sofrer. Mas o amor da amizade é feito de outra matéria. É uma chama que ilumina o dia e a noite, é uma âncora em porto seguro, é a árvore que quanto mais antiga,  mais maravilhosa. E algumas amizades , mesmo que novas, são antigas. Logo as recobre uma pátina de compreensão mútua.
Talvez por isso tenha feito tantos poemas sobre essa espécie de amor que é a amizade, onde a aceitação do outro sem que se queira modificá-lo é a única lei.
Tenho amigos de todas as espécies, de todos os jeitos. Sei que são meus amigos porque se preciso estão presentes, porque me adivinham, porque me amarraram com cordas fortíssimas nas linhas de suas mãos.
Grande parte dos meus amigos está longe. Mas o que é a distância se temos a telepatia, o coração e toda a tecnologia ?


AMIGO

que um amigo se reconheça
sempre
na face de outro amigo
e nesse espelho descanse
seus olhos
e derrame sua alma
como a crina de um cavalo
levemente pousada no vento

In Poesia Essencial, Ed. Manati

terça-feira, 22 de novembro de 2016

UM JARDIM DE PALAVRAS

Recebi os presentes mais lindos dos adolescentes da EMAFA de Cachoeiras de Macacu, alunos e alunas da Professora Jaline Silva, hoje, em nosso Café, Pão e Texto.
Eles criaram um jardim especialmente para mim.
Sãos os "Dez motivos para ofertar flores à Roseana Murray (se pudéssemos lhe ofertar flores para cada motivo que temos para amar você e a sua poesia, lhe daríamos...)

1 - Rosas... pela maneira sensível de você ver o mundo...
2 - Dálias... pela sua criatividade poética que nos envolve...
3 - Margaridas...pela sua generosidade em compartilhar conosco suas inspirações e sentimentos...
4 - Girassóis... por você ser uma pessoa que irradia energias positivas...
5 - Tulipas... por ser a poesia a sua verdadeira casa...
6 - Camélias... pela delicadeza com que escolhe as palavras que irão nos tocar
7 - Cravos... pela pureza de cada verso com o qual nos presenteia
8 - Lírios... por encontrar tanta riqueza na simplicidade cotidiana...
9 - Petúnias... por encher nossas vidas de um colorido especial...
10 - Orquídeas... por nos receber de braços abertos em sua casa e nos acolher com tanto carinho e infinita poesia.

Cantaram meus poemas, dançaram meus poemas, me encheram de amor.
A minha emoção é maior que o mar.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

UM ALMOÇO ESPECIAL

Para amanhã começo a preparar um almoço muito especial. Vou receber os alunos da Professora Jaline Silva, da oitava série, de Cachoeiras de Macacu. A E.M.Almerinda Ferreira de Almeida.
Essa escola encerra o Café, Pão e Texto de 2016.
Por ter recebido uma carta de uma aluna, onde todos os outros alunos assinam, com uma carga de emoção imensa, resolvi, ao invés do café da manhã, fazer um almoço de despedida, onde a varanda se transformará num restaurante, pois aluguei mesas e cadeiras.
É uma grande tarefa, receberemos mais de 30 pessoas. Mas virá uma merendeira para nos ajudar. E também alguns professores.
Um dos meus desejos para 2017 é que tenha escolas para que meu projeto possa continuar.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

AMOR

Hoje um amigo me disse : o amor é a única vacina para esse tempo de tanto ódio.
E no entanto, todos queremos amor, todos queremos ser amados.
Quando fomos a Lanzarote, nas Canárias, eu e Juan, fazer uma longa entrevista com José Saramago, Pilar nos disse: "José escreve para ser amado".
É mais fácil amar que odiar. O ódio dá trabalho. Gera muita confusão nas oficinas do ser. Confusão e barulho.
O amor gera mergulho e silêncio e poesia.
Prefiro o amor.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

VIAGENS

Começam a se esboçar as primeiras viagens para o ano que vem.
Ainda são esboços, mas já trazem em seus traços o gosto da aventura, como ao olharmos uma pera na fruteira, já antecipamos seu gosto de nascente.
Então olho o mar e logo ali, atrás do horizonte, um Barco a Vela me espera, um Pégaso, um Tapete Voador.

BAGAGEM

Como desembaraçar
os fios,
os rios,
oceanos, montanhas,
as linhas do passado
e as teias do futuro?
Como entender
as setas
e os instrumentos
que afinam o tempo?
De que matéria,
de que vento
o mapa escrito
na pele,
na fronte,
onde a fonte
que acende as palavras?
Tudo,
as sombras,
as sobras,
são a bagagem do viajante?

Poema inédito.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

ESPANHOL

Somos uma ilha de português num mar de espanhol por todos os lados.
Cada vez que faço um Café, Pão e Texto, Juan, meu marido que é espanhol, diz: Buenos Dias e eles repetem.  E querem mais. ADORAM!!!
Todos sabemos que uma criança aprende uma língua brincado, de um minuto para outro.
Então fica a pergunta tão simples: Por que nenhuma criança sai falando espanhol das escolas quando termina a quinta série? Por que não sai falando nenhuma língua estrangeira?
Somos América Latina. Por que se optou por ensinar inglês e não espanhol, mas ninguém sai falando inglês tampouco?

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

MACONDO

Chove em Saquarema como em Macondo.
Chove em Visconde de Mauá, onde mora a metade de mim, sem parar, desde muitos dias. Minha família fica enviando notícias. Caiu uma barreira na estrada Resende -Mauá.
A chuva tem um efeito hipnótico, como o fogo.
Mas enquanto o fogo nos acorda, a chuva constante nos adormece. Nos conduz para um estado de semi vigília, para o reino da nostalgia, as cores se apagam, há uma bruma que vai também apagando as fronteiras entre o que é hoje e o que é sempre. E parece que nunca , nunca mais, vai parar de chover. Faço um poema cedo de manhã e logo em seguida me mudo para Macondo, onde estou vivendo agora algumas horas do meu dia, enquanto releio maravilhada, Cem Anos de Solidão.Como disse meu grande amigo Cristiano Mota Mendes, As Mil e Uma Noites Caribenhas.

A chuva me diz memórias
que flutuam
por sobre os telhados
encharcados, escorregadios.
Me diz melancolia
e folhas pisadas
e as horas que escorrem
feito água
ninguém sabe para onde,
para que desvãos.
A chuva toca seus sinos
na manhã que ainda
é fino esboço quase aquarela.
E as mãos buscam sol.

domingo, 13 de novembro de 2016

POETAS

Alguns poetas nos acompanham para sempre, onde quer que estejamos, fritando um ovo na cozinha, andando no bosque, lendo sobre o massacre no Congo. E nos ajudam a viver.
Alguns poetas, entre os inúmeros poetas que amo, me chegaram da maneira mais linda.
 No que seria hoje o quinto ano, naquela época o último ano do ginásio, ganhei um livro de poemas do Vinicius da minha professora Rosa Hermann. Foi um grande encontro. Abriu meu coração para a poesia.

Muito jovem, quase menina, apareceu em minhas mãos, não sei como,  o Romancero Gitano do Lorca,  Era um livro bem pequeno com uma rosa vermelha na capa. Uma rosa que era um incêndio. E fiquei tão abalada com a musicalidade extrema da sua poesia, com as suas imagens maravilhosas-maravilhosas e inesperadas sempre.
Neruda me chegou pelas mãos da Bárbara Vicuña, uma chilena que abriguei em minha casa na época do Golpe . Ela me deu os 20 Poemas de Amor e Uma Cancão Desesperada. Sempre estive apaixonada por Neruda.
Assim que saiu o Poema Sujo do Ferreira Gullar, ganhei um exemplar da minha amiga Ana Cristina Chiara e este livro foi um dos maiores terremotos poéticos que já vivi.
E os meus outros poetas que vivem comigo, eu mesma fui ao seu encontro, como quem vai caminhando na rua e de repente acha um arco íris, a árvore mais intensa.

PRELUDIO

Las alamedas se van
pero dejan su reflejo.

Las alamedas se van,
pero nos dejan el viento.

El viento está amortajado
a lo largo bajo el cielo.

Pero ha dejado flotando
sobre los rios sus ecos.

El mundo de las luciérnagas
ha invadido mis recuerdos.

Y un corazón diminuto
me va brotando en los dedos.

Federico García Lorca


sexta-feira, 11 de novembro de 2016

DELÍRIOS

Lá em Recife, quando da primeira apresentação do meu livro tão pequeno, Delírios, com William Amorim, que fez uma leitura psicanalítica dos poemas, para a inauguração da Casa Azul, de Joana Cavalcânti, eu disse que tudo começa com um Delírio. Algo que se sonha antes que aconteça ou não.
Fui escrevendo esses poemas ao longo dos dias e meses, sem pensar que estaria fazendo um livro. Mas depois os juntei, como se fossem um ramalhete de flores ou um feixe de trigo e sonhando na vigília, delirei: E porque não fazer um e book e porque não fazer um livro artesanal, construído devagarinho, com uma capa de pano? Então Domingo Gonzalez, que eu não conhecia apareceu para fazer o livro. E minha irmã Evelyn Kligerman fez placas incríveis de cerâmica para fazer os desenhos do ebook. E sabendo que não encontraria uma editora para os poemas, levei a tarefa adiante.
O livro está pronto. Hoje Domingo me entregou os últimos exemplares dos 50 que encomendei.Tenho que escrever o título e meu nome à mão , em cima da capa verde de algodão. O livro cabe no bolso, na bolsa, mas seus poemas são fortes, latejam.
E continuei delirando. E por que não fazer o lançamento no Babel Restaurante, com meu filho André Murray preparando o coquetel? O restaurante estará fechado e podemos usar o seu espaço para isso.
E pedi ao Centro Cultural de Visconde de Mauá que levasse o Coral, porque para o meu delírio ficar completo preciso ouvir a música Celador de Sueños . E Márcia Patrocínio me disse que sim. Só fica faltando meu filho Guga Murray e seu magnífico violão, pois como o lançamento cai numa terça-feira, dia 29 de novembro, Guga não pode ir, pois estará dando aula.
Em nossa família de artistas gostamos de trabalhar juntos. É um prazer imenso saber que a música, a poesia, a comida e a cerâmica, nessa família, estão bem entrelaçadas.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

E.M.JOÃO BAPTISTA CAFFARO

Vou começar a história pelo fim. O encontro das crianças com o mar.
Muitas crianças da E.M.João Baptista Caffaro, nunca haviam visto o mar.
Hoje, especialmente, o mar havia feito uma piscina imensa e as crianças não aguentaram de felicidade.
Foi para elas uma experiência extraordinária.
Sabiam tudo da minha vida, lemos muitos poemas brincando, comemos e rimos.
A manhã passou voando e agora vive na mala das lembranças inesquecíveis, dentro de cada um.

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

TRUMP

Como acalmar o coração sabendo que Trump, eleito Presidente dos Estados Unidos, afina a sua voz com os grandes ditadores do planeta de todos os tempos, o seu talento histriônico e seu gestual nos lembram Mussolini e o conto Mário e O Mágico do Thomas Mann?
Para onde nos levará, se sua música são os muros, as armas, a expulsão do diferente e seu discurso traz os ecos dos piores nacionalismos?
O mundo já caminhava a passos largos para a destruição. Mas agora, com o ódio como bandeira, há um abismo desconhecido sem passagem de volta.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

MISTURINHA

Misturar crianças da Educação Infantil com primeiro, segundo e terceiro ano dá certo?
Deu certíssimo hoje no Café, pão e Texto da E.M.Outeiro das Pedras, de Itaboraí. Bem que a Paula Botelho, Diretora de todas as boas idéias de leitura de Itaboraí tinha me avisado.
As crianças me fizeram tantas declarações de amor , que saí do planeta , alcancei a lua e agora navego nos anéis de Saturno.
Eu realmente poderia abrir uma loja de suspiros de felicidade, pois hoje suspirei umas 3000 vezes.
Brincamos, rimos, cantamos. As professoras Sabrina, a Diretora Maria do Socorro, Jussara, Suely, Suzana, Gisele, Maria de Fátima, a Supervisora de alunos Adriana Silva e o Professor Lucas , (acho que não esqueci ninguém) acompanhavam as crianças. Minha amiga, também professora, Prica Mota, veio. E vieram 3 convidadas e um marido, alunas de pedagogia da Faculdade Veiga de Almeida de Cabo Frio.Luana, Elisângela e Ana Paula. O marido era o Rubens.
Hoje as crianças brincaram horas no jardim antes de partir. E se encantaram com as árvores de cravo e canela.
Samuel e Vanda, incansáveis na produção do Café junto comigo.
E ninguém queria r embora. Todo mundo queria morar aqui. Para Sempre.

sábado, 5 de novembro de 2016

CHUVA

Chove sem parar aqui na montanha. A época das águas. Frio e neblina.
Amo esse tempo de hortências, fogo para aquecer a casa, livros e novos poemas. Mas hoje é meu último dia aqui. O tempo escorre como a chuva que cai e desaparece entre a terra. O tempo que nos encharca de afetos, amores, perdas e ganhos.
Construo devagarinho uma nova coletânea de poemas. A poesia é a minha verdadeira casa.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

NA MONTANHA

Estar na montanha desmancha o tempo. Quando chego parece que sempre estive aqui, desde sempre.
No livro que estou lendo, do Manguel, A Cidade das Palavras, ele fala do conceito de tempo entre os esquimós e é assim que sinto o tempo: Imóvel . Nós é que nos movemos, para frente, para trás, em círculos. E quado uma história é contada, mesmo que seja tão antiga, que tenha mais de mil anos, o ouvinte está lá, naquele tempo.
Então, nós, leitores, temos a capacidade de sim, viajar no tempo e no espaço, pois vivemos em mundos paralelos. E o tempo não pode ser dividido, claro que não.
Aqui, na montanha, eu flutuo na pele do tempo.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

VINTE E SETE PROFESSORAS DE ITABORAÍ (BASTIDORES)

Receber vinte e sete professoras para o Café, Pão e Texto, é tarefa maravilhosa. Há toda uma preparação prévia. Encomendo o empadão de legumes alguns dias antes da Liliam, filha da Vanda, a minha caseira. Samuel vai buscar o empadão de bicicleta.
Acordo muito cedo para fazer o pão. Quero que saia do forno às 8.30 h, para que comam o pão quentinho. Hoje ralei tomate para passar no pão, receita espanhola, muito simples: rala-se o tomate no lado grosso com casca e tudo. A casca fica inteira na mão da gente, e então, a gente põe azeite e sal.
Bolos e café com leite, sucos também. Ah, a toalha mais linda, que comprei em Olinda com Joana Cavalcânti e Conceição Cavalcânti, num domingo inesquecível.
Separo os livros .Estão ao alcance da mão. Mas nunca tenho um roteiro prévio. Tudo vai se desenrolando naturalmente. Vou puxando o fio da meada.
Todo mundo quer fotos. Todo mundo quer abraços. Todo mundo quer carinho e autógrafos.
Falamos poesia, falamos vida. O que podemos fazer, o que está ao nosso alcance.
E assim, juntando um poema no outro, um desejo de mudança no outro, uma inquietação na outra, um assombro no outro, o tempo escorre das nossas mãos e já fica um gosto de sabor indefinido, uma certa nostalgia : saudade.    

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

OUTRA VEZ A MALA ABERTA

Fui ao Recife e voltei. Foi tudo tão maravilhoso que parece que foi um sonho bom. Dois eventos que tiraram a Terra de sua órbita sossegada e a emoção era tanta que não podia nem dormir à noite. Joana Cavalcânti criou uma atmosfera real e onírica ao mesmo tempo. Eu e William Amorim inauguramos a série de Saraus da Editora Massangana, da Fundação Joaquim Nabuco e inauguramos a Casa Azul, simbolicamente na Livraria Cultura, que logo começará a funcionar em sua sede. Será um Centro irradiador de literatura e arte.
Mas já estou novamente com a mala aberta. Sexta-feira bem cedo vou para Visconde de Mauá, para a minha casinha da montanha.
Dentro da mala levo uma tonelada de saudades da família. Faz muito tempo que não nos vemos. A viagem é muito longa, pois não se trata apenas de estradas. Mas é preciso passar de uma dimensão para outra. De uma atmosfera para outra. De um perfume de algas para os cheiros magníficos da montanha.
Gosto mais do que tudo do cheiro da terra quando a chuva cai. E do cheiro da lenha quando acendo o fogão e inunda a casa. Gosto do cheiro da manhã e da noite. Gosto do breu da noite.
Quando vou subindo a serra uma alegria selvagem começa a me inundar.
Tudo isso eu já sei ao olhar para a mala aberta.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

NORDESTE

Parece que os ventos estão me levando para o Nordeste. Amanhã vou para o Recife fazer dois eventos que me enchem de alegria: Um encontro com professores dia 21 na Fundaj e o Sarau Residência no Ar, a primeira apresentação do meu livro Delírios, que será feita por William Amorim, escritor e psicanalista de S.Luis, na Livraria Cultura Paço Alfândega. O Sarau é a inauguração da Casa Azul de Joana Cavalcânti, um espaço de arte e sonhos.
Esse nome Paço Alfândega é lindo e mexe com a minha memória:
Quando eu era criança, meu pai muitas vezes me levava até o porto, na Praça XV, ou para se despedir de alguém ou para receber alguém. Naquela época as pessoas vinham de outros países de navio e tinham, claro, que passar pela alfândega. Uma parada obrigatória.
Eu era fascinada com um homem gordo, que ficava sentado atrás de uma mesa com uma tabuleta onde se lia POLIGLOTA.
Eu o imaginava falando todas as línguas do mundo e jamais o esqueci.

 Deve ser por isso que meu gato se chama Babel, que o restaurante do meu filho se chama Babel. Adoro uma mistura de línguas!!!

terça-feira, 18 de outubro de 2016

CAFÉ, PÃO E TEXTO

Recebi a E.M.Natércia Rodrigues Rocha, de Itaboraí, para o penúltimo Café, Pão e Texto do ano, pelas mão das professoras Élida, Raquel, Eveline, Geruza e Carmem Valéria.
Vieram crianças de várias séries misturadas e deu muito certo! As dinâmicas com os poemas saíram lindas, as crianças eram vivas, maravilhosas.
Conversamos sobre muitas coisas, sérias e engraçadas.
Com meu livro Colo de Avó, muitos falaram da sua avó e do que ela gostava de fazer. O amor que sentem pela avó transborda. Uma disse que a avó gostava de costurar e li o poema Máquina de Costura. Foi lindo ver como o poema se encaixava na sua avó.
Foi lindo ver como dando linha, a pipa da imaginação deles vai muito longe na apreensão do poema.
As professoras eram tão amorosas, o encontro foi tão bom, as crianças nunca querendo ir embora, que agora estou em pleno voo.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

CACHOEIRA; BAHIA; FLIQUINHA

Poucas cidades me impactaram tanto quanto Cachoeira na Bahia. Já do aeroporto até lá, o verde enche nossos olhos. Assim é o Recôncavo, diz o motorista que me buscou em Salvador. Passei por dentro de Santo Amaro. Ao chegar na cidade, já a Pousada, dentro de um antigo convento, dá vontade de chorar de tanta beleza. O casarão de 1765 impressiona.
Saí andando e o casario e o rebuliço de gente me deixou extasiada.
A Flica e a Fliquinha fazem a Festa Literária mais bonita do mundo. Gente se apresentando na escadaria da Igreja, o Projeto ler na Praça com centenas e centenas de livros para quem quiser ler, seu Museu do Cinema, uma preciosidade, com Roque Araújo, que foi câmera de todos os filmes de Glaber Rocha, memória viva do cinema brasileiro, que atende cada pessoa como se fosse única, as barracas vendendo livros e comidinhas, a casa poesia do poeta Damário da Cruz, que já se foi para as estrelas, mas deixou sua poesia inscrita em Cachoeira.
A cultura negra corre forte junto com o rio Paraguassú e infelizmente não tive tempo de visitar nenhum quilombo. A Flica levou grandes nomes. A Fliquinha era uma alegria só. E havia povo na rua. Uma festa nada elitista: para todos.
Minhas duas apresentações foram lindas. Com as crianças, e a plateia estava lotada, num espaço maravilhoso, dentro do cinema. À noite, com os adultos, houve um entrelaçamento de magias. Passamos o vídeo Visita à Casa Amarela, do Caó Cruz Alves, que está no meu site e depois fui falando meus poemas, contando a construção de cada livro e ninguém queria ir embora. Um jovem que veio de longe falou seu poema que era a síntese perfeita de tudo o que havia acontecido.
Para o meu livro Abecedário (Poético) de Frutas pedi que me dessem alguma memória afetiva de uma fruta da infância. Muitos me contaram e um dos que havia falado, de repente me deu um pote de tamarindo cristalizado sem saber que tamarindo era a fruta querida da minha infância, já que eu andava pela Alameda Engenheiro Richard no bairro do Grajaú, apaixonada pelas árvores de tamarindo e suas frutinhas que catava no chão. Como ele poderia saber?  Pura poesia.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                        

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

FLIQUINHA

Amanhã vou para Cachoeira, na Bahia, participar da Fliquinha, Feira de Livros. Terei dois encontros, um com o público infantil e outro com o adulto.
Estou feliz. A Bahia sempre me deixa feliz, aliás o Nordeste. Gosto do cheiro do vento de lá. Gosto do calor humano. Gosto da fala tão musical. Gosto da comida. Fiz amigos maravilhosos na Bahia e talvez encontre algum por lá. Caó, desenhista, cartunista, cineasta, talvez apareça num pé de vento, se tiver carona, pois mora em Salvador. Vamos passar o seu documentário, Visita à Casa Amarela. Malena, que mora em Feira, disse que ia. Malena tem um projeto maravilhoso  de leitura em  Feira de Santana. Vai faltar Verbena, mulher com jeito de flor, minha grande amiga irmã, que está na Espanha.
Sou africana por dentro e a Bahia, pra mim, é um pedaço da África. Infelizmente não vou poder ficar mais tempo pois na sequencia vou pro Recife, quase o tempo de chegar em casa, tomar um banho e trocar de roupa...

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

E BOOKS


Agora estou focada nos meus e books. Sinto uma energia tão grande nesse projeto que parece que vou partir para uma grande viagem, rumo a um planeta desconhecido.
Não consigo publicar meus poemas dirigidos ao público, digamos, adulto. Nenhuma editora se interessa. Então resolvi publicar as minhas coletâneas em formato digital , sem nenhum lucro. Qualquer pessoa pode acessar gratuitamente.
Mas, para não perder a dignidade, mandei fazer 50 exemplares da coletânea DELÍRIOS,, numa edição artesanal, com técnica do século XVII, por Domingo Gonzáles, o que me provoca uma grande alegria. Imagino que poderiam ter sido produzidos na pequena gráfica onde trabalhava Natanael, maravilhoso personagem do livro Como a Água que Corre, da Marguetite Yourcenar, que lemos no Clube. E assim, apago as fronteiras do tempo, apago as fronteiras entre realidade e ficção.
O livro em papel ficou lindo. Mas a edição digital será maravilhosa também, com desenhos feitos em cerâmica pela minha irmã Evelyn Kligerman. Em dezembro estará accessível.
E então aconteceu  uma alegria inesperada, já que a vida é uma caixinha de música, mas ao contrário das caixinhas com a bailarina aprisionada para sempre nos mesmos acordes, a música nunca se repete:
Joana Cavalcânti me convidou para a inauguração da sua Casa Azul, em Recife. E aí vou apresentar meu livro novo, Delírios, com a voz do William Amorim, grande amigo, psicanalista e escritor, que fala poesia lindamente. Ele irá de São Luis ao Recife especialmente para isso e para dividirmos o palco na Fundaj, num evento lindo para professores .
Depois farei um lançamento do Delírios em Mauá, no Babel Restaurante do meu filho André Murray e então, quem sabe terei novamente a voz do William e a presença da Joana. Vou dando corda na minha caixinha. 


domingo, 9 de outubro de 2016

COMO A ÁGUA QUE CORRE

A CASA AMARELA

Essa casa tem cheiro
de algas,
de maré cheia,
de lua entornada.
Essa casa
é uma senhora
que me deixa
dormir
em suas madeiras,
na memória
dos dias acumulados.
Essa casa
tem gavetas
cheias de sol,
janelas e portas
abertas,
por onde entram
borboletas e amigos
cheios de sinos.
Essa casa me habita.

Os amigos vão chegando e enchendo a varanda, transformando o ar em alegria.
De dois em dois meses nos reunimos, o Clube de Leitura da Casa Amarela, para celebrar a literatura, que nos ajuda a viver, para celebrar a amizade e a vida.
Às vezes vem alguém de longe, como o Maximiniano, que veio de Salvador.
Alguns chegam do Rio, como Cristiano e Ana. André e Christiane moram em Niterói.
O livro Como a Água que Corre, da Marguerite Yourcenar, é uma obra prima. São três contos, sendo que o segundo, longo, é uma novela.
O primeiro conto, Ana Soror, fala de uma paixão imensa entre dois irmãos. Amor, desejo, interdição. Em pleno século XVI, numa atmosfera sufocante, de uma religiosidade doentia, que beira a alucinação, Marguerite constrói com poesia e uma maestria absoluta, esse belo , belíssimo relato, de onde saímos transtornados.Pouco a pouco, cada um trazendo a sua parte de leitura, como num mosaico, o conto vai se ampliando, crescendo, transbordando e muitas pessoas disseram que iriam reler o conto depois da discussão.
Um Homem Obscuro, nos traz um dos personagens mais belos da literatura, Natanael. Um homem do século XVII, absolutamente singular, pois a sua mente é atemporal e sua sensibilidade oceânica. Natanael nos contamina com sua bondade , simplicidade e beleza. Vivemos junto com ele os seus amores, a sua maneira de se relacionar com as pessoas, os animais, a sua aceitação sem preconceitos de tudo o que é humano.  Obscuro por excesso de luz?
Da relação de amor de Natanael com a prostituta Saraí nascerá Lázaro, com quem Natanael não conviveu. Mas Marguerite nos oferece a dádiva desse desdobramento de Natanael em Lázaro, no terceiro conto,  e então voamos , e não existe mais nenhuma fronteira entre a realidade e o sonho.
Lázaro é ator, faz papéis femininos, é um menino que vai se transmutando, de personagem em personagem, ele é toda a humanidade, e a morte puxa a carroça, a vida segue, como a água que corre.
Para terminar lemos belíssimos poemas de Murilo Mendes.
O almoço foi esplêndido, parecia que também estávamos na carroça com Lázaro e sua trupe, e logo ali, era a curva fora do tempo, onde a alegria é amarela.
O próximo encontro será dia 17 de dezembro e vamos ler Eça de Queiróz: A Relíquia e As Cidades e As Serras. Cada um deve trazer um poema do Fernando Pessoa.     

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

VISITA ESPECIAL

Amanhã é o nosso encontro do Clube de Leitura da Casa Amarela. Receberemos uma visita muito especial Maximiniano , que faz sua tese sobre leitura, veio de Salvador para Saquarema apenas para participar do Clube.Ele estuda dinâmicas sensíveis de formação do leitor.
Tem vindo gente de longe. Nosso Clube já escapa e quando vejo atravessou o portão e brilha lá longe no horizonte.
É uma das minhas grandes fontes de alegria.
Este mês de outubro parece que quer me levar pelos ares até onde não sei, de tanta emoção.
Semana que vem vou para Cachoeira, na Bahia, onde faço um encontro com meus leitores no dia 14, na Fliquinha.
E dia 20 vou para o Recife, onde tenho duas atividades maravilhosas.
O meu  primeiro Café, Pão e Texto Itinerante, dia 21 na Fundaj, para os professores, às 18:30h e dia 22 o Sarau Residência no Ar, na Livraria Cultura, Paço Alfândega, representando a Casa Azul da Joana Cavalcânti.
William Amorim apresentará meus poemas do novo livro Delírios.
Alguns momentos são especialmente luminosos em nossas vidas. Este é um deles.  

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

ITABORAÍ

Amanhã será um grande dia: irei a Itaboraí com a Prica Mota, para a culminância de um projeto de leitura imenso e belo. Durante meses, mais de oitenta escolas de Itaboraí estão lendo meus poemas. Muitas escolas vieram até a minha casa participar do Projeto Café, Pão e Texto. Recebi professores absolutamente envolvidos com a leitura. Cada encontro foi mais maravilhoso que o outro.
Amanhã estarei com 250 crianças pela manhã e muitos professores à tarde.
O esforço para superar dificuldades, o entusiasmo, a arte e criatividade dessas professoras e professores me fazem acreditar que sim, se pode fazer uma educação que faça toda a diferença, baseada em leitura e arte.
Estou muito emocionada.Nem consigo imaginar que da minha mesa de trabalho a minha poesia escapa para invadir tantos corações.
Levarei minha neta espanhola Kira, que sábado voltará para Barcelona. Ela terá uma menina de 10 anos como anjo da guarda.É Clarice, a filha da Diretora do Departamento de Leitura, Paula Botelho.
Kira não fala português e está animadíssima e ansiosa com a experiência que viverá.
E eu agradeço essa cachoeira de amor.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

VIAGENS

Meu primeiro livro de poesia para adultos se chamava Viagens e houve apenas uma edição , pela extinta Editora Memórias Futuras, em 1984.
Alguns poemas aproveitei em outros livros.
Um deles , apesar de tão antigo eu adoro. O poema se chama Residência no Ar e define um estado de espírito.
Em minha próxima viagem ao Recife, além do encontro com professores na Fundarj, no dia 21, teremos um sarau de poesia na Casa Azul, idealizada por Joana Cavalcânti. Joana me conta: a Casa Azul será um Centro de Artes, Encontros, Terapias onde muita coisa acontecerá. Mas por  enquanto é ainda uma residência no ar, pois a casa não está pronta, mas simbolicamente já está. E o sarau será no dia 22, na Livraria Cultura, Paço Alfândega, que estará representando a Casa Azul.
Estarei apresentando em primeira mão os poemas do meu livro Delírios, que serão falados por William Amorim.

RESIDÊNCIA NO AR

Não sei o que me convém,
se uma casa segura,
janelas, quartos e trincos
ou se as portas
todas abertas,
se residência no ar.

Não sei o que me convém,
se uma casa encerada,
a família pro jantar
ou se ventania na estrada,
se residência no ar.

Não sei o que me convém,
se uma casa caiada,
com horta, jardim e pomar,
ou se andarilha no mundo,
se residência no ar.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

LIVROS

O filósofo George Steiner, de 88 anos , diz numa entrevista que lê todos os dias algum trecho de livro em cada língua que domina, para prevenir do Alzheimer.
Eu faço quase isso, leio bastante nas línguas que sei, porque tenho pânico de perdê-las. Não há prazer maior do que estudar e saber outro idioma. Ler em outro idioma. O milagre de já não se saber que se está lendo em outra língua.
Ele também diz que onde houver um livro, uma caneta para fazer anotações e um café, já está pronto o território para o voo. Eu não preciso de quase nada. Os livros me dão quase tudo.

LIVROS

Uma vida é tão pouco,
melhor seria viver mil
vidas, mil e uma noites
e histórias.
Nosso tempo é tão pouco,
melhor seria viajar
no tempo.
Mergulhar nas páginas
de um livro e se perder
para se achar.

in Cinco Sentidos e Outros, Lê Editora.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

DE VOLTA PRA CASA

Cheguei em casa. Desfaço a mala e arrumo as próximas viagens. Terei dois encontros no nordeste com meus leitores.
Amo o nordeste de paixão e minha felicidade é imensa, pois estarei com amigos que amo.
Preparo o encontro do Clube dia 8. Muita coisa maravilhosa acontecendo.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

UM PINGADO NA PADARIA

Estou hospedada em Búzios dentro de um restaurante que aluga dois quartos. É um casarão imenso e antigo, maravilhoso.
O Café da Manhã só para nós, pelas mãos da Adriana ,já que ocupamos os dois únicos quartos, é servido com o mar quase aos nossos pés. Ouvimos o sussurro do mar, a voz dos pescadores, o motor dos barcos.
Não entro no mar, não gosto de tomar sol na praia. Gosto de contemplar e caminhar.
Como o café só é servido às nove horas, eu e Juan saímos bem cedinho para tomar um pingado em alguma padaria.
É a hora em que os turistas dormem e os empregados dos hotéis chegam. É a população que mais tarde fica invisível.
Gosto de sentir essa vida subterrânea. Essas pessoas vivem na Rasa. Aqui onde estou o turismo é pesado. Mas só aparece mais tarde.
Gostamos de almoçar num restaurante bem pequeno, no caminho da praia dos Ossos, ao lado de uma peixaria, que se chama O Barco. A comida é boa, o peixe fresco e o preço justo. Búzios é muito cara. Há que tomar cuidado.
De madrugada o vento faz o casarão gemer, chorar, ele quase se dobra, range, fala a língua das madeiras antigas. Lá longe um apito de barco corta o meu sono. Levanto, abro a janela, faço um poema, volto a dormir.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

CORAL ENCANTA BÚZIOS

Estou em Búzios.Aqui vive e trabalha meu amigo Maestro Moisés Santos com seu Coral Encanta Búzios, de meninas adolescentes, que vivem em zonas menos turísticas.
Todos sabem o que a música pode fazer pela auto estima das pessoas.
Mas o Maestro Moisés vai  muito além. A sua comunicação com cada uma das jovens é fantástica e isso é um dom.
Espero que Búzios tenha consciência do nível altíssimo do seu trabalho musical e humano e não o deixe escapar.
O Maestro Moisés é um orgulho para qualquer cidade.
Hoje, de madrugada, na vigília, ainda tinha nos olhos a vista maravilhosa do meu quarto.
Então fiz um poema:

GAIVOTAS

Pela janela
meu olhar escapa
e em seu voo
enlaça
o barco pousado
na pele do mar
e da sua vida
oculta,
na pele da música.
Meu olhar varre o convés
escorregadio,
embaralha
rotas e ventos,
pronto
para desfazer
nós e âncoras,
levantas as cordas,
partir.
Um grito
de gaivota assina
o ar.

domingo, 25 de setembro de 2016

BÚZIOS

Búzios é linda. Eu a conheci em 1972. Não havia NADA!!! Só a beleza solta no vento. Acampamos com meu filho André com 3 anos na Praia da Ferradurinha, numa noite de lua cheia.
Recebo um convite de Búzios: dia 8 de dezembro uma Escola Quilombola me fará uma homenagem. Erika Anjos me escreve e eu respondo que sim, vou. Mas que gostaria da presença do Coral Encanta Búzios com meu amigo Maestro Moisés, que já me disse que sim.
E amanhã vou para Búzios com minha família espanhola: Maya, minha enteada e meus netos de estimação, Kira Velvet de 11 anos e Astor Kai com 4 e Juan. Vieram de Barelona e estamos muito felizes com eles em casa, a casa de pernas pro ar.
Fazia um ano e três meses que não nos víamos. Kira, minha neta, que já virou um livro lindo pela Lê Editora,  cresceu tanto que parece impossível e já combinamos: ano que vem ela virá sozinha para ficar aqui os dois meses das suas férias. Nós nos amamos. Queremos viajar juntas, só nós duas.
Estou esperando a confirmação da E.M.Clotilde , onde tenho minha Sala de Leitura, para fazer uma Roda de Leitura levando a Kira, dia 4. Desmarcaram a data combinada por problemas técnicos e estou aqui torcendo. Kira fala fluentemente três línguas e já entende bastante bem o português.Mas antes de tudo fala fluentemente a língua do amor.

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

UTOPIA

Sobre a palavra UTOPIA me diz o Houaiss: Descrição imaginativa de uma sociedade ideal; plano irrealizável, fantasia.
Então a utopia não pode acontecer, porque se for realizada, não era uma utopia. Mas muitas coisas que eram utópicas aconteceram , em parte.Pensar em férias remuneradas no século XIX para os trabalhadores seria uma utopia na época. Então não podemos deixar que as utopias morram dentro da gente. A gente morre junto.
O mundo anda difícil de ser digerido, com todas as suas crueldades, com todos os excluídos. Já no café da manhã o jornal vai me contando: que um barco de imigrantes... que não sei quantas mortes... que a Guerra da Síria...
Mas não se pode desistir .Por isso fica cada dia mais claro para mim que temos que sensibilizar muito as crianças para a compaixão e o amor, para a paz. Quero o bem do outro. Isso não é utopia, Isso pode acontecer hoje, a cada minuto.  

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

MAIS UM

Mais um Clube de Leitura nasceu, inspirado em nosso Clube de Leitura da Casa Amarela.
Silvane Silva , a ex Diretora da E.M.Hermann Muller, na zona rural de Joinville, me dá notícias:
O Clube se chama "Clube de Leitura do Ipê Amarelo" e o primeiro livro será A Alegria de Ensinar de Rubem Alves. O espaço é maravilhoso, a Agrícola da Ilha, do Seu Dario, um parque de tirar o fôlego e que abriga a minha hemerocallis, abriu as suas portas numa linda parceria.
Silvane convida todos os professores de Joinville . E no primeiro encontro haverá uma Oficina  de Danças Circulares.
Devo prevenir: Silvane faz malabarismos de transformação. Nada do que toca fica indiferente aos seus dedos verdes. Pude presenciar a sua maravilhosa pedagogia no que seria para mim uma das melhores experiências de Educação do Brasil.
Com certeza , esse Clube, dirigido pela Silvane, fará muita diferença na vida de cada participante.
Corram e garantam os seus lugares.
Contatos pelo MSN do facebook.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

SILÊNCIO

Preciso de silêncio para funcionar. Quase não consigo ouvir música aqui na beira do mar, pois o mar já é música, sua orquestra, totalmente encaixada no silêncio, ocupa a casa inteira . E a casa acompanha: as madeiras estalam e rangem, a casa quase oscila com o movimento das ondas.
E muitas vezes me deixo flutuar nesse silêncio maravilhoso. Aí os meus poemas acontecem.
Leio artigos interessantes sobre o silêncio. Como é necessário e urgente em nosso mundo tão barulhento e com excesso de estímulos.
Mergulhar no silêncio é uma grande experiência.
Às vezes estou na montanha e é outro tipo de silêncio, mais denso, mais palpável, mais grosso, menos esgarçado. Como se houvesse uma partitura do silêncio. Uma para cada lugar.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

DE OUTRA CIVILIZAÇÃO

Um anigo me diz: _ Você não existe, você é de outro planeta.
Confesso que sou sim de outra civilização.
Sou tão antiga que ainda uso caderno de telefone de papel .
Tão antiga que não gosto de ler na tela. Preciso do livro de verdade, seu cheiro, sua capa, sua textura.
Não sou apaixonada por  tecnologia.  Sei o mínimo para sobreviver neste mundo novo.
Claro que adoro o zap, assim tenho família e amigos perto de mim o tempo todo. Mas sou incapaz de jogar um joguinho, mesmo o mais simples possível com o meu neto. Expliquei isso a ele e então me disse:
_Fica tranquila, vovó, vou te dar um jogo bem simples.
E colocou na tela um ursinho para colorir.
Claro que adoro os avanços da medicina, que permitiu que minha coluna fosse reconstruída e eu pudesse viver sem dor.
Mas me sinto sempre meio à margem. Meio deslocada. Meio imigrante. Meio desajeitada. Meio de outra civilização.
Como um viajante com uma mala de madeira num aeroporto, quando deveria estar numa estação de  trem dos anos 50.
Mas dentro da mala carrego tesouros.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

TRANSBORDAMENTO

Amanhã recebo um grupo de 25 professores de Itaboraí, onde sou lida por mais de 80 escolas.

Ontem Pica Motta, que esteve presente em nosso encontro com as crianças, me disse que com as minhas ideias sobre educação, não caberia numa escola, transbordaria.
Mas ontem as crianças tiveram uma grande aula sobre vários temas, sentadas no chão, em cima de tapetes, brincando e cantando. E onde é que está escrito que a criança não pode ter uma aula assim?
Com certeza jamais se esquecerão do que aprenderam ontem.
E Marguerite Yourcenar, em seu livro De Olhos Abertos, tem ideias muito parecidas com as minhas. A criança tem que antes de tudo ter o sentimento do mundo.
Por isso adoro reeber professores no meu Café, Pão e Texto. Para que juntos a gente transborde.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

CAFÉ, PÃO E TEXTO

Amanhã recebo mais uma escola na minha varanda para um Café, Pão e Texto.
Terei um convidado muito especial para as crianças, mas é surpresa, só conto depois que o encontro acontecer.
Esse Projeto é a maior fonte de alegria da minha vida e vai subindo morro, descendo morro, atravessando montanhas e mares, pois muita gente de longe gostaria de vir.
Hoje recebi uma mensagem de uma turma de professores de Goiânia, mas infelizmente não tenho a data que eles e elas desejavam. Porque também recebo turma de professores.
Nosso Clube de Leitura , que é um desdobramento do Café, Pão e Texto, vai receber em outubro, um convidado que vem direto de Salvador para cá.
E assim, me transformo em Ícaro sem deixar que minhas asas se derretam ao sol, me transformo em chuva benfazeja, em gota de orvalho, me transformo em árvore e semente. De pura felicidade. Não há nada melhor do que doar felicidade.
E talvez aconteça algum Café, Pão e Texto por aí.  O Café, Pão e Texto Itinerante . Quem sabe...
 

domingo, 11 de setembro de 2016

O QUE SOMOS

Não há nada que me comova mais do que o destino das crianças refugiadas.
Em outro país, geralmente hostil, outra língua, geralmente afastados da constelação que era a sua família, muitas vezes longe da mãe. como uma criança pode aguentar tanta dor?
Vi a foto de uma criança que tampava os olhos da sua boneca para que ela não visse a guerra.
Essa foto, junto com a do menino morto na praia, nos diz o que somos: a triste espécie humana.
E ao mesmo tempo, capazes de acolher, ajudar, consolar, amar.
Como resolver este enigma?  

terça-feira, 6 de setembro de 2016

POESIA É FICÇÃO?

Ontem conversando com Roger Mello , ele me diz, "...você que escreve ficção..." e eu disse, mas Roger, eu não escrevo ficção, um conto ou outro, mas escrevo mesmo é poesia."  E ele me responde:
"Mas poesia não é ficção? Tudo o que se inventa é ficção!"
Achei genial, porque ficamos presos a determinadas fórmulas e quando penso ficção não penso em poesia, mas em contos, romances, novelas. E aí vem o Roger e derruba tudo com um sopro.
Escrevo poesia, que também inventa mundos e sensações. Pronto, concordo, poesia também é ficção.
E então um poema do Borges, que realmente escrevia ficção e que oferece o ouro da sua poesia:

A UN GATO

No son más silenciosos los espejos
ni más furtiva el alba aventurera;
Eres, bajo la luna, esa pantera
que nos es dado divisar de lejos.
Por obra indescifrable de un decreto
divino, te buscamos vanamente;
Más remoto que el Ganges y el poniente,
tuya es la soledad, tuyo el secreto.
Tu lomo condesciende a la morosa
carícia de mi mano. Has admitido
desde esa eternidad que ya es olvido,
el amor de la mano recelosa.
En otro tiempo estás. Eres el dueño
de un ámbito cerrado como un sueño.

Jorge Luis Borges - Obra Poética

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

A ÁGUA DA ALEGRIA

Nas segundas feiras há que lavar o rosto com a água da alegria,para que a semana comece a funcionar.
Fiz então um poema:

A ÁGUA DA ALEGRIA

Abro os olhos
e deixo que a manhã,
luz por luz,
entre no quarto,
retire a noite
e suas teias
do meu corpo.
Mais um dia
nessa longa lista
de partidas
e chegadas.
Lavo o rosto,
nas mãos em concha
a água da alegria,
coo se fosse um rio.

Poema inédito.

domingo, 4 de setembro de 2016

GUAXUPÉ

Preparo a viagem para Guaxupé, Minas, onde sou a poeta da Feira Literária.
Parto amanhã e adoro aeroportos, repito com o Bandeira: "O aeroporto em frente me dá lições de partir."
É muito bom levar na mala uma cidade desconhecida e acontecimentos que ficarão na memória.
Já sei que a cidade está me recebendo com muito amor:
"Qualquer espécie de amor já e um pouco de saúde, um descanso na loucura." Nos diz Guimarães em Grande Sertão.
Setembro já navega em águas luminosas, cheia de encontros e viagens.

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

CLUBE DE LEITURA DOS CAJUEIROS VERMELHOS

No ano passado recebemos a visita em nosso Clube de Leitura da Professora Zete, de Ribeiro do Amparo, interior da Bahia.
Ela passou uns dias aqui em casa e me falou do seu sonho de também fazer um Clube de Leitura.
Agora ela me oferece a bela notícia: seu Clube já vai começar com 10 pessoas.
O primeiro livro será O Pequeno Príncipe.
E ela me pede um nome pro seu Clube, já que sou a Madrinha.
CLUBE DE LEITURA DOS CAJUEIROS VERMELHOS.
Que o Clube incendeie Ribeiro do Amparo e inunde a cidade com o mel dos livros e faça muitos novos leitores.
É o meu desejo.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

EM ESTADO ALTERADO DE POESIA

Há uma maneira de viver que faz a vida mais interessante.
Há que viver em estado alterado de poesia.
Muita gente já disse isso. Filósofos e poetas. Ferreira Gullar sempre diz isso. A palavra mágica é ASSOMBRO.
O que o dia de hoje vai colocar na minha porta?
Quando eu era criança o leiteiro deixava uma garrafa de vidro de leite que eu achava linda.
Ás vezes a vida nos traz garrafas maravilhosas, às vezes com um gênio dentro.
Outras vezes um pão duro e seco, que mal desce pela garganta, com vidro moído dentro.
Mas caminhar com o olhar de assombro ajuda a receber a vida em todo o seu não sentido, em todo o seu caos.
E de onde menos se imagina, um poema salta feito peixe dourado, reluz.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

EQUILÍBRIO PRECÁRIO

Nós, seres humanos, temos uma auto estima tão frágil, seu equilíbrio, em nossas mãos é tão precário. Às vezes se desvanece diante de nossos olhos.
Então nos desmanchamos.
Se somos assim, adultos, imaginemos as crianças.
Eu me lembro, na minha infância, de professores cruéis.  Um grito, uma palavra deslocada, bastava para me deixar aniquilada.
Os tempos mudaram, as escolas mudaram, mas todo o cuidado com a criança é pouco.
A auto estima se fortalece com a criação, com tarefas que amamos.Quando somos reconhecidos.
Dar esse espaço para a criança é fundamental. Abraçar é fundamental.

DESEJO DE ABRAÇO
Desejo de abraço
nunca passa.
Abraço é o nó mais delicado
que há.
Um braço aqui e outro lá
e o coração se derrete,
o corpo afunda na mais
gigantesca felicidade.
in Poço dos Desejos, Ed. Moderna


domingo, 28 de agosto de 2016

AGOSTO

Gloria Kyrinus , minha amiga poeta, me pediu um poema sobre o mês de agosto, perguntou se eu tinha algum. Era para a sua Oficina Lavra Palavra.
Eu não tinha,
Mas respondi: _ Faço um agora.
Respirei profundamente o ar de agosto e fiz o poema.

AGOSTO

Agosto
prepara seus ventos,
seus alvoroços,
redemoinhos
de sonhos e flores
para guardar
em cofres e canastras,
malas de madeira
do passado
cheirando a sândalo.
Agosto prepara
as sementes
de uma primavera
ainda adormecida
no horizonte.
Agosto prepara amores.

Gloria me conta: A oficina foi um sucesso. As pessoas ficaram muito emocionadas em saber que o poema foi escrito para elas.

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

COISAS SIMPLES

Se a vida é por um triz, se a vida é um sopro, se é na corda bamba, se somos equilibristas entre a vida e a morte, por que desperdiçar o tempo fazendo o que não se ama?
O tempo é só o que temos e somos feitos de tempo e luz.
Se a vida não tem roteiro e vem um vento e vira tudo, para que acumular tanto, exibir tanto, se para estar vivo basta respirar? Se para estar vivo basta mergulhar no próprio tempo e no amor, já que também somos feitos de amor?
Somos tão frágeis, tecido que se desmancha, somos tão fortes, liana, corda, elo com o outro.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

SEGUNDA FEIRA

Um amigo uma vez me perguntou o que eu faço nas minhas segundas feiras.
Eu adoro  qualquer segunda feira. Porque pressupõe uma primeira que eu não sei onde fica. Talvez em Pasárgada?
Hoje, segunda-feira, posso ouvir o moinho do tempo, movido a ventania, a sudoeste, moendo folhas e pensamentos.
Bem cedinho fiz bicicleta ergométrica olhando o mar de ressaca. Fui ao Pilates. Fui ao Banco. Fui ao Correio. E me sentei no boteco na frente da Lagoa para um pingado e contemplação.
Fiquei muitos dias ausente e agora vou aos poucos retomando contato com o trabalho. Mas a fábrica de poesia não parou nem um dia. São os fios da vida que organizam o seu funcionamento, faça dor ou alegria.
No dia 1 de setembro recebo a primeira escola nesse meu retorno. E me preparo para a Feira Literária de Guaxupé. Tudo isso cabe nesta segunda feira de frio.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

CAMINHANDO POR BOTAFOGO

Estou no Rio, na cidade que já foi minha.
Caminho por Botafogo.
Minha paixão são as vilas. Elas possuem uma maneira tão delicada de falar comigo que quase choro. Sou transportada.
Encontro casarões maravilhosos.
E alguns nichos do passado.
Paro num sapateiro. Numa loja muito velha, com um chão gasto de azulejos hidráulicos, dezenas e dezenas de sapatos se esparramam, se amontoam, esperando a sua vez de serem consertados, pregados, martelados, transfigurados.
Por onde já terão caminhado esses sapatos e que ruas ainda irão percorrer cada um com sua música?

terça-feira, 2 de agosto de 2016

EM SAQUAREMA

Voltar para casa em Saquarema é receber o mundo inteiro de uma vez só, junto com o mar , o jardim, as gatas. Porque sou casada com Juan Arias, jornalista, e em suas veias correm notícias junto com seu sangue.
Vivemos um tempo em que saber de tudo quase nos asfixia e tento me proteger como posso para não me desmanchar .
Enquanto o mundo pulsa em nosso corpo, cresce em nós, como uma planta carnívora, a sensação de impotência.
Penso que trabalhar no pequeno ajuda, pequenos gestos, pequenos atos de escuta e solidariedade, fazer a vida de quem está perto da gente um pouco mais fácil, levar alegria para quem a gente pode.
Quando tenho tantas solicitações que quase me afogo, paro tudo e respiro. Muitas vezes nos esquecemos de respirar.  
Fiz uma opção de vida. Moro numa cidade muito pequena. Acho que as grandes cidades trituram as pessoas.Mas quem não pode sair tem que buscar e construir seus espaços de leveza, leitura e contemplação.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

NEBLINA

Hoje aqui na montanha o tempo virou. Amanheceu com neblina, uma poeira de irrealidade sobre todas as coisas.
Os dias escorrem e logo, feito a neblina que se dissipa, estarei em Saquarema, na minha outra vida, recebendo escolas, planejando encontros.
Esse tempo que passo aqui com a família é um grande tesouro. O que carrego para onde vou. O meu escaravelho dourado.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

E O SOL?

Frio. Quem sabe estou na Polônia, na aldeia do meu pai, quando ele era criança e rezava por um raio de sol.
O sol desapareceu.
Cozinho na lenha. Acendo a lareira. Leio. Escrevo.
O tempo vai se enrolando-desenrolando, aqui na montanha: teia de alumbramentos.

terça-feira, 19 de julho de 2016

GABRIELA

Tenho duas vidas e duas casas. Uma no mar e outra na montanha.
Na montanha é onde me encontro com os filhos e netos. Este mês de julho estou aqui, com a minha família.
Ontem trouxemos minha neta Gabriela para passear em Maringá (Visconde de Mauá é cheia de vales). Seu sonho de consumo é a loja de chocolate.
Enquanto a família se instalava num café, fomos nós duas caminhar. Gabi é falante e adoro seguir o curso do seu rio de pensamentos. A sua última moda é dizer "nem pensar" quando não quer alguma coisa. E meu neto Luis ensinou e ela repete como um mantra: "eu sou doida, eu sou doida, eu sou muito barulhenta". " Ela vai fazer três anos em novembro e não tem medo de nada. Adora atravessar a ponte e vai falando com todos os cachorros e deixa que eles cheirem a sua mão. Adora olhar o rio lá embaixo. Eu vou tentando olhar o mundo com os seus olhos.
A relação da Gabi com gatos, cachorros, cavalos, é emocionante. Todos os dias ela dá maçã ao Merlin, o cavalo do sítio (ele tem quase quarenta anos). Sabe colocá-la na terra a uma distância segura para que ele venha pegá-la. O Merlin é apaixonado por ela e deixa que ela monte a pelo.
Não existe dádiva maior do que uma criança poder viver a sua infância dentro da natureza.

domingo, 17 de julho de 2016

CLUBE DE LEITURA NA MONTANHA

No dia 16, sábado, minha pequena casa no alto de uma montanha, em Visconde de Mauá,  quase explodiu de poesia.
Uma vez por ano, no inverno nos reunimos aqui. Para sentir frio, para celebrar a vida e a literatura, com comida e vinho.
Verdade que ontem o inverno não apareceu. Fazia até um pouco de calor.
Começamos com os dois poemas dos dons do Borges e seus acordes maravilhosos fizeram com que a emoção envolvesse a sala e cada um de nós.
Lemos em voz alta o conto O Outro do Borges e Suzana Vargas falou sobre a diferença entre literatura fantástica e do absurdo e todos falamos dos nossos "outros", os que nos habitam desde a mais longínqua infância.
Falamos de Clarice e seu magnífico conto Felicidade Clandestina. Do conto como um rito de passagem. Da crueldade infantil, da crueldade do ser humano, da bondade. Da relação erótica que o leitor apaixonado tem com os livros que lê. Cada um falou de que maneira toca o  livro.  Ana , como bibliotecária do Sesc Teresópolis, falou do ciúme que tem dos livros que empresta.
Passamos para Teibele e seu Demônio do Bashevis Singer , conto delicioso, saboroso, triste e alegre, o "demônio" que sabe tocar Teibele, com suas carícias e histórias, que a desperta para o amor.
E A Balada de Adam Henry , de Ian McEwan, com o Clube cheio de advogados, Chico, Hélio, André, Christiane e um médico,Dr. José Augusto Messias, foi uma discussão maravilhosa .
Durante o almoço os advogados continuaram discutindo a questão de não se poder fazer transfusão de sangue em Testemunhas de Jeová. E Messias relatou vivências terríveis nos hospitais envolvendo esta questão.
O meu filho Chef André Murray preparou uma feijoada e nos cedeu uma funcionária, a Lurdinha, para ajudar .
Como num teatro, transformamos todos juntos a sala num restaurante para vinte e duas pessoas, pois chamei amigos daqui e a família para comer com a gente.
Dani, minha nora Chef confeiteira preparou uma torta sacher de sobremesa. Cantamos parabéns para a Bruna, aniversariante de julho.
E fomos felizes para sempre.
Nosso próximo encontro será dia 8 de outubro e vamos ler Como a Água que Corre, da Marguerite Yourcenar e cada um deve trazer um poema do Murilo Mendes. 

quinta-feira, 14 de julho de 2016

NA MONTANHA

Aqui na montanha os dias escorrem como areia dourada.
Começo a preparar o encontro do Clube de Leitura no dia 16.
Hoje chegam meus primeiros convidados.
Os dias estão esplêndidos e as noites frias e enluaradas.
Eu me alimento com a música das árvores.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

NA MONTANHA

Quando criança amava um livro que se chamava A Fada Menina. Uma menina entrava no buraco de uma árvore e saía no País das Fadas.
Parece que entrei nesse buraco e ... estou aqui na montanha, dentro do bosque.
O frio chegou à noite, de repente. Amo o frio. Amo tudo aqui. Como descrever o cheiro de mato com o cheiro do fogão de lenha aceso e o cheiro do sol, tudo junto?
Dia por dia estarei aqui para receber os amigos, o Clube de Leitura da Casa Amarela, que acontecerá aqui no dia 16.
A felicidade existe.

terça-feira, 5 de julho de 2016

PALAVRAS

Alguém já namorou uma palavra, assim de se apaixonar, de colocar na boca e sentir seu gosto misterioso, colocar no corpo feito perfuma raro?
Poetas são pessoas que se apaixonam por palavras, querem se casar com elas e as convidam para dançar no poema.E para isso o poeta tem que projetar o Salão de Dança, isto é, o poema, mesmo sem ser arquiteto, ou sendo apenas, arquiteto de nuvens e espaços siderais.
As palavras são a música do poeta, cada palavra tem, além do som, mil esconderijos. E é com elas que os poetas fabricam imagens.
Poetas são caçadores de palavras.
A prova disso? O belo poema do Drummond:

O LICOREIRO

O gosto do licor começa na idéia
licoreiro.
Digo baixinho: licoreiro.
Que sabor no som, no conhecimento do cristal
independente de licor-de-leite,
fabricação mui fina da cidade,
segredo da família de Oscarlina.

O licoreiro, vejo-o
delicioso em si, mesmo vazio
à espera de licor, de tal maneira
na forma trabalhada
habita o gosto perfumado
e em cada prisma-luz, se distribui
ao paladar da vista já gozando.

_ Que tem esse menino, a contemplar
o tempo  todo o licoreiro
se dentro dele não há nada?
Meu Deus, esse menino é viciado,
está na pua, só de olhar o licoreiro!

Carlos Drummond  de Andrade. Boitempo.